terça-feira, maio 28, 2013

Amado Batista desabafa: "Fui torturado e mereci"


Amado Batista deu entrevista no último domingo. Crédito: Arquivo pessoal
Amado Batista deu entrevista no último domingo. Crédito: Arquivo pessoal

O desabafo se seguiu a uma admissão de culpa inexistente: “Fui torturado. Eu mereci isso”. Amado Batista, um dos cantores com mais discos vendidos do país (mais de 30 milhões), revelou à apresentadora Marília Gabriela, no programa De frente com Gabi, no domingo, ter sido torturado pelo regime militar instalado no país entre os anos de 1964 e 1985. A revelação engrossa a lista de artistas mais ligados ao segmento popular da música brasileira perseguidos pela ditadura, na qual constam Odair José, Waldick Soriano, Luiz Ayrão, entre outros.

O goiano Amado Batista contou ter sido preso e mantido em cárcere por quase dois meses depois de ajudar militantes ligados à oposição à ditadura - segundo ele, pessoas com intenção de tomar o governo pela força das armas. Por volta dos 18 anos, o artista trabalhava em livraria onde recebia publicações consideradas subversivas pelo regime da época. E facilitava a leitura para intelectuais e opositores do governo. Disse ter se comprometido até a enviar ao Maranhão o salário recebido por um frequentador da loja prestes a se refugiar no Nordeste. 

“Me bateram muito, me deram choques elétricos. De vez em quando, batiam na mesa”, narrou. Ao ser libertado, pensou em interromper a carreira e morar na rua. “Fiquei atordoado. Quis largar tudo e virar andarilho”. Desconfortável em falar sobre o assunto, Amado se sente culpado. “Acho que mereci. Eles me corrigiram como uma mãe corrige um filho. Eu estava errado por ter acobertado pessoas que queriam tomar o país à força. Mereci”, avaliou o cantor, rebatido de imediato pela apresentadora: “Você não mereceu, Amado”. O cantor de Princesa, Meu ex-amor e Seresteiros revelou receber uma pensão para anistiados políticos no valor de aproximadamente R$ 1.000. Mas prefere não remexer o passado e até questiona o montante pago pelo governo. “Não é necessário”. 

A perseguição a cantores populares, embora menos ressaltada pela “intelectualidade” brasileira, ocorreu com intensidade na ditadura. O pesquisador Paulo César Araújo relata, no livro Eu não sou cachorro, não, vetos, censuras, prisões e torturas cujas vítimas eram os chamados artistas bregas (veja exemplos abaixo ). Em entrevista recente, ele declarou: “Você tinha a repressão política e a repressão moral juntas. A MPB vai sofrer a repressão política, pois a temática de artistas como Vandré e Chico Buarque era política. Já os bregas tocam na questão moral, sofrem outro tipo de repressão. Falavam de temas considerados tabus, como pílula, prostituição, drogas e homossexualidade”.

PERSEGUIDOS

Odair José também já confessou ter sofrido dutante a ditadura. Crédito: Renato Ribeiro/Divulgação
Odair José também já confessou ter sofrido dutante a ditadura. Crédito: Renato Ribeiro/Divulgação

Odair José
O cantor teve a música Pare de tomar a pílula vetada por falar de sexo e contrariar a política de controle de natalidade do governo. A canção foi  proibida até na Argentina. Odair compareceu diversas vezes ao departamento de censura e chegou a ser detido por cantá-la em shows. Músicas dele sobre prostituição, drogas e sexo também esbarraram na truculência ditatorial.

Waldick Soriano
Apesar de ter a obra mais ligada ao romantismo, o cantor penou na mão dos militares. A música Tortura de amor desagradou simplesmente porque continha a palavra “tortura” no nome, termo incômodo ao regime diante das acusações de abuso contra os direitos humanos. Foge de ti caiu em desgraça diante das autoridades por “ofender” a moral e os bons costumes da época.

Luiz Ayrão
Da turma do “samba-joia”, como pontua Paulo Cesar Araújo, sentiu a mão da censura com a canção Treze anos. A suposta associação aos 13 anos do golpe militar de 1964, claro, irritou os militares. O título mudou para O divórcio. O hit de Fernando Mendes Tributo a Carlinhos - sumido na ditadura - foi banido  por lembrar presos desaparecidos.